Publicada em: 15 de outubro de 2021.
Um dos assuntos mais debatidos em tempos de
pandemia gira em torno da obrigatoriedade da vacina, ou seja, se a referida
imposição não estaria violando a liberdade individual e de crença, direitos
estes previstos na Constituição Federal.
Por se tratar de assunto polêmico, inclusive pelo
fato de que o Brasil passa por um perÃodo de polarização polÃtica muito
extrema, a ideia desse espaço no Portal é analisar a situação por meio do
prisma social e econômico bem como no âmbito trabalhista.
Referente à questão social, compete ao indivÃduo,
caso assim entenda, optar pelo recebimento ou não de imunização contra o
COVID-19, não podendo o Estado determinar que a vacina seja aplicada à força,
mas somente impor ao cidadão que recuse a vacinação, as medidas restritivas
impostas pela legislação, conforme elencado pelo Ministro Ricardo Lewandowski
(Relator) no julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 6586
e 6587.
No entanto, quando trazemos essa questão para o
âmbito do Direto do Trabalho, observamos que a vontade do individuo não pode se
sobrepor ao da coletividade.
Pense-se, por exemplo, em uma empresa que possua
mais de mil colaboradores trabalhando lado a lado, sendo que apenas um
indivÃduo dentre todos escolheu não se imunizar, trazendo assim, apreensão e
riscos aos demais trabalhadores.
Como amplamente divulgado, as vacinas hoje
disponÃveis não tem o condão de garantir uma imunização de 100%, entretanto,
quando todos os colaboradores, seguindo o exemplo acima citado, estão
devidamente imunizados, contribuem de forma substancial para diminuir a
propagação da doença.
Nesse contexto, a insurgência do trabalhador quanto
à vacinação somente seria aceitável em decorrência de recomendação médica, uma
vez que, conforme já destacado, a saúde coletiva se sobrepõe integralmente
sobre qualquer direito individual.
Sobre esta questão é importante mencionar o
entendimento adotado pela Ministra Cármen Lúcia, (no julgamento das Ações
Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 6.586 e 6.587) destacando que "a
Constituição não garante liberdades às pessoas para que elas sejam
soberanamente egoÃstas".
Portanto, sobre o prisma do Direito do Trabalho, é
possÃvel concluir que sobre o empregado que se recusar a participar da
imunização contra o COVID-19, recairá o ônus quanto a possibilidade de rescisão
do contrato de trabalho, inclusive por justo motivo, visto que não se mostraria
razoável a manutenção do labor conjuntamente com a possibilidade de propagação
da doença no ambiente de trabalho.
Sobre a questão da rescisão por justa causa,
recentemente a 13ª Terceira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região
referendou, por unanimidade, a decisão proferida pelo JuÃzo da 2ª vara do
Trabalho de São Caetano do Sul, que manteve a justa causa aplicada a
trabalhadora, que de forma injustificada, se recusou a tomar a vacina
disponibilizada.
O acórdão proferido, em parte de sua fundamentação,
também consignou ser necessário observar o interesse coletivo, “pois, ao
deixar de tomar a vacina, a reclamante realmente colocaria em risco a saúde dos
seus colegas da empresa, bem como os demais profissionais que atuam no referido
hospital, além de pacientes, e seus acompanhantesâ€.
Sobre o prisma econômico, a rescisão por justa
causa, diferente de outras modalidades de rescisões, causa um impacto
financeiro muito duro sobre o trabalhador, posto que são resguardados apenas
alguns direitos trabalhistas.
Veja-se que ao trabalhador demitido por justa estão
resguardados somente os seguintes direitos: saldo de salário (valores
referentes aos dias trabalhados), férias vencidas e salário famÃlia (caso se enquadre no
programa).
Em comparação, o trabalhador que é demitido sem
justo motivo, além dos direitos já elencados acima, receberá também o 13º
salário, as férias proporcionais, o aviso prévio, a multa de 40% sobre
o FGTS e a possibilidade de buscar
acesso ao programa de seguro desemprego e levantar o FGTS depositado em sua conta
vinculada.
O Brasil, como se sabe, além de ser um dos paÃses
com o maior Ãndice de mortalidade em decorrência do coronavÃrus, também enfrenta uma taxa
de desemprego superior a 14% (mais de 14 milhões de brasileiros desempregados)
e uma grande crise econômica, que tem elevado consideravelmente os preços de
produtos básicos para alimentação e do combustÃvel, encarecendo, portanto, a
vida de toda a população.
Assim, não se mostra crÃvel, seja por motivo
polÃtico, crença ou outras convicções, que ainda existam trabalhadores que se
recusam a participar do programa de vacinação contra a COVID-19, ainda mais com
a possibilidade do contrato de trabalho ser rescindido por justa causa e o fato
de a vacinação ter se demonstrando um antidoto essencial para sairmos o quanto
antes do marasmo econômico que vivemos.
Por Lupércio Monferdini Novo D’Arcádia e João
Chagas de Oliveira Tourinho
DisponÃvel em https://www.contabeis.com.br/artigos/6991/a-vacina-contra-a-covid-e-a-justa-causa/
Publicada por Morgana Paulette.